Na semana passada, o Parlamento da Nicarágua, dominado pela
ditadura sandinista, aprovou mudanças na Constituição do país relativas à
Polícia Nacional que, entre outros pontos, subordinam totalmente a corporação
ao governo e estabelecem pena de dois a três anos de prisão para os policiais
que desertarem.
A Polícia Nacional, que serve como agente de repressão do
regime do ditador Daniel Ortega, vive uma onda de saídas, e alguns desses
policiais, assim como outros apoiadores do regime sandinista, estão se
aproveitando de falhas numa política migratória do governo Joe Biden para fugir
para os Estados Unidos.
Em janeiro, o governo americano implantou uma iniciativa que
permite que até 30 mil imigrantes da Nicarágua, Cuba, Venezuela e Haiti entrem
nos Estados Unidos mensalmente.
O objetivo era aliviar a pressão da imigração ilegal na fronteira com o México, já que as crises política, humanitária e econômica nesses quatro países geraram um fluxo recorde de pessoas tentando entrar em território americano.
Os Estados Unidos aplicaram sanções em março de 2020 contra
a Polícia Nacional, pelo seu papel repressivo dentro da Nicarágua, mas agora
agentes estão se valendo da nova política migratória de Biden para se mudar
para o país mais rico do mundo.
Um caso recente emblemático é o de María de Jesús Guzmán
Gutiérrez, ex-chefe do comando da Polícia Nacional em Matagalpa. Promovida em
setembro de 2021 pela ditadura sandinista, este ano ela fugiu para os Estados
Unidos, segundo o advogado Yader Morazán, ex-funcionário do Poder Judiciário e
analista de assuntos jurídicos.
Em entrevista ao jornal nicaraguense La Prensa, ele destacou
as falhas do programa migratório lançado por Biden em janeiro. “O problema
reside no fato de que os requisitos para obter o abrigo humanitário não são tão
rigorosos e [os americanos] não fazem perguntas aprofundadas, que poderiam
colocar em dúvida a elegibilidade de pessoas que estiveram envolvidas de alguma
maneira em atos de repressão ou corrupção na Nicarágua”, relatou o analista.
Morazán destacou que, para a concessão do abrigo
humanitário, as únicas exigências “basicamente” são que o patrocinador, isto é,
algum morador dos Estados Unidos que possa acolher o requerente, esteja em
situação de “solvência econômica” e que o beneficiário não tenha histórico de
crimes praticados dentro do território americano.
“Não há um exame minucioso, como nos casos de asilo
político, e por isso vemos que muitas pessoas próximas ao regime estão indo
para os Estados Unidos”, criticou o advogado.
Um levantamento realizado pelo La Prensa identificou mais de
30 ex-apoiadores ou ex-agentes de repressão da ditadura nicaraguense que
chegaram aos Estados Unidos nos últimos meses. Para evitar problemas na entrada
no país, eles buscam apagar fotos e informações de redes sociais que possam vinculá-los
ao regime sandinista ou até seus perfis completos.
Ao mesmo tempo, revelou o jornal, ao menos três padres da Nicarágua, vítimas da perseguição de Ortega à Igreja Católica, tiveram negados vistos para os Estados Unidos porque “não cumpriram requisitos”.
Flagrados em jogo de beisebol em Miami
Em março, a Comissão Permanente de Direitos Humanos (CPDH)
da Nicarágua denunciou ao Departamento de Estado dos Estados Unidos a presença
de pessoas ligadas ao regime sandinista no país.
A organização apontou que quatro apoiadores de Ortega foram
vistos acompanhando uma partida de beisebol entre as seleções da Nicarágua e da
Venezuela em Miami. O apoiador sandinista Juan Caldera foi identificado e
imigrantes nicaraguenses o chamaram de “assassino” e gritaram para que deixasse
o estádio, segundo relatos.
O comissário geral da Polícia Nacional, Julio Sánchez, foi
alvo dos mesmos protestos; ele e o paramilitar Edgard Zapata Arévalo viajaram
aos Estados Unidos como parte da comissão técnica da seleção nicaraguense.
Também foi identificado Evert López Aguirre, prefeito sandinista de El Rosario, cidade localizada no departamento de Carazo.